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‘Nossa luta é diária’, diz indígena de Coroa Vermelha que já venceu prêmios de empreendedorismo

Luena Maria Ferreira dos Santos, 38 anos. Indígena da etnia Pataxó, atualmente lidera uma associação de pescadores em Coroa Vermelha


Luena Maria Ferreira dos Santos, 38 anos. Indígena da etnia Pataxó, atualmente lidera uma associação de pescadores em uma tribo de Coroa Vermelha, Santa Cruz Cabrália. A luta pela sobrevivência que está no DNA de Luena reverbera a situação de abandono histórica dos povos indígenas, que resistem a conflitos, violação de direitos e ao estereótipo reproduzido até hoje sobre os povos que deram origem à nação brasileira.

Única mulher de uma família com cinco filhos, Luena perdeu os pais quando ainda era muito nova. Aos 9 anos, ficou órfã de mãe, e aos 15 perdeu o pai. Mãe de Margarida [16], Íris [15], Iasmin [6] e Lívia Vitória [3], de dois casamentos, a história de Luena é diretamente associada ao mar e os negócios. O trabalho começou cedo, aos 13 anos, apesar da desaprovação do pai, que defendia que apenas os irmãos de Luena deveriam trabalhar.

“Sempre tive um espírito livre, sempre quis minha independência”, afirma a Pataxó.

Aos 21, ela casou com um belga e eles decidiram comprar um barco, que levou o nome da primeira filha. “Eu e ele começamos a pescar, eram tempos de fartura. Só que quatro anos depois ele faleceu. Eu passei a comprar os camarões e a tratar”, disse Luena.

Apesar de ter parado de estudar aos 21 anos, por causa do casamento e trabalho, ela chegou a cursar o último ano do ensino médio. Mas, como ela mesma se orgulha em dizer, Luena já fez curso “de gente formada”.

“Eu não paro de fazer curso, sou curiosa e meu sonho é ainda poder estudar com minhas filhas. Tenho mais de 13 cursos na parte de gestão financeira, contabilidade, administração”, conta.

Anos depois da morte do marido, já em 2010, ela foi trabalhar na Associação dos Pescadores de Coroa Vermelha, onde já tinha uma equipe de mulheres que atuavam por lá.

Luena Maria Ferreira dos Santos atua como presidente da Associação de Pescadores de Coroa Vermelha, na Bahia — Foto: Arquivo pessoa

Em duas gestões distintas, Luena assumiu a função de tesoureira. Depois, após conversa com o então presidente da associação, ela pediu, e convenceu, que ele passasse a liderança da associação para ela, mesmo com dívidas com contas de luz, água, entre outras. Porém, ele não imaginava que a composição da diretoria seria formada apenas por mulheres, o que foi contestado entre os pescadores.

“No início deu ciúme, eles começaram a questionar por não ter homens, mas aceitaram. Na minha diretoria só tem mulher. Fizemos uma votação e deu tudo certo. Eu que escolhi a equipe, que é só de mulheres”, orgulha-se Luena.

“Não colocamos só indígenas, mas não indígenas também, que são esposas de pescadores. Temos o nosso grupo, da nossa diretoria. É o grupo das tigresas. Temos o nosso espaço”, conta.

A indígena foi em busca de parcerias para quitar os débitos da associação e ainda conquistou melhorias para o grupo, que vive da pesca de peixes e, principalmente, do camarão.

“A gente conseguiu rádio para os pescadores. Foi uma luta de dois anos, conseguimos esse rádio e uma base completa também, que mantém a segurança no mar e o contato entre todos os barcos”, conta Luena.

Luena Maria quando ganhou o prêmio de empreendedorismo feminino do Sebrae — Foto: Arquivo pessoal

Foi com esse trabalho na Associação dos Pescadores Indígenas Pataxós de Coroa Vermelha que Luena conquistou o primeiro lugar na etapa estadual do Prêmio Sebrae Mulher de Negócios, em 2014, na categoria Produtora Rural. E, o segundo prêmio, veio na etapa nacional, que ela conquistou o terceiro lugar.

Além disso, ela faz parte do comitê do extremo sul da Bahia do setor da pesca. Segundo ela, todas as colônias e associações do extremo sul, que vai de Belmonte a Canavieiras, onde tem todos os presidentes, estão dentro desse comitê, onde há diálogo direto com uma empresa grande da região.

“Sempre falei de colocar a casa em ordem e temos parcerias para conquistar melhorias sempre. Ganhamos um projeto em 2019 no valor de R$ 270 mil, que é do governo. Participamos desse edital e conseguimos ganhar esse projeto, que é de uma cozinha industrial, onde vamos trabalhar com o resto do peixe, que já aprendemos a fazer isso, que é o bolinho do peixe, a linguiça do peixe, o espetinho do peixe”, conta Luena.

Luena Maria na associação de pescadores de Coroa Vermelha, na Bahia — Foto: Arquivo pessoal

Porém, com a pandemia, o projeto ainda não saiu do papel. A associação reduziu bastante o volume de pesca e o volume de venda, e agora fechou por causa do defeso do camarão. “Então, desde o ano passado que vinha em queda por causa da pandemia, mas ainda trabalhávamos, porque o foco é o camarão. E agora tem o defeso”, disse.

Além disso, Luena conta que desde 2019 que a situação tem complicado para as marisqueiras e pescadores. “Teve o derramamento de óleo, depois falaram da doença que estava no peixe, o que ajudou a prejudicar ainda mais o pescador e a marisqueira. A pandemia só veio para piorar”, conta. *G1

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